O Esquadrão 421 chegou a Vigo e está a caminho de Paris, onde é esperada a próxima comitiva de Zapatistas
Os sete membros do Esquadrão 421 que cruzaram o Atlântico de barco (La Montaña), chegaram a Vigo no domingo dia 20 de Junho, entre chuva, vento e frio, e desembarcaram na praia na terça-feira, dia 22 de Junho, sob um sol resplandecente. Cada uma se aproximou do microfone para se apresentar, algumas usaram a língua espanhola, mas a maioria usou línguas indígenas do México, como o tzotzil, tzeltal, cho’ol e tojolabal. Apesar de serem igualmente fluentes em espanhol, a tradução não lhes pareceu necessária. Marijose, uma pessoa não-binária (unoa otroa), foi a primeira Zapatista a pisar território europeu. No seu discurso, renomeou a Europa de SLUMIL K’AJXEMK’OP (terra insubmissa).
O ato de renomear e o de usar línguas indígenas próprias e diversas não são apenas atos simbólicos conscientes, mas representam a essência do trabalho que agora se nos apresenta a todes. A descolonização e a procura de formas sustentáveis de viver em comunidade são ações concretas, não apenas discursos teóricos, porém o trabalho começa com a transformação da nossa língua, o repensar da fala e da comunicação, e a alteração dos nomes impostos a objetos, animais, plantas, ruas, lugares. Depois continuaremos com a desaprendizagem de noções hegemónicas de tempo e de espaço. Por aqui passam os caminhos para futuros mais justos e dignos para todes.
O Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN) governa municipalidades autónomas e autossuficientes em Chiapas, México, desde a insurreição armada em defesa dos direitos dos povos indígenas a 1 de Janeiro de 1994. Anunciaram uma viagem pela vida por todos os continentes e começaram pela Europa. A ocasião é o quingentésimo aniversário da conquista de Tenochtitlán (Cidade do México) pela Espanha, porém não vêm à procura de vingança ou a requerer um pedido de desculpas. A alegre presença dos Zapatistas no continente é uma afirmação de que os povos indígenas continuam a resistir e a viver em dignidade.
As Zapatistas vêm para se encontrarem com a Europa de baixo e à esquerda, para trocar conhecimentos com movimentos, coletivos, organizações e indivíduos que formam a resistência, para partilhar refeições, jogar futebol, e aprender e desaprender com as lutas umas das outras. Em As Sete Peças Soltas do Quebra-Cabeças Mundial (1997), o defunto Subcomandante Insurgente Marcos (hoje Galeano) traça a destruição de nações pelo neoliberalismo, o qual apelida de Quarta Guerra Mundial (a Terceira sendo a chamada Guerra Fria). Este ensaio não só continua relevante e atual, mas todas as peças que examina chegaram a proporções escandalosas nas últimas décadas. A desigualdade continua a subir exponencialmente; exploração segue sendo a base da nossa economia (“a produção capitalista continua a basear-se no trabalho de crianças, mulheres e migrantes”); migração forçada e deslocamento aumentaram devido a guerras, pobreza extrema, persecução, e a crise climática; paraísos fiscais continuam pujantes e prósperos; o imperialismo estado-unidense permanece uma força opressiva e violenta como nunca.
As boas notícias são que a sétima peça, os bolsos de resistência, também cresceu. “Ao mesmo tempo que o neoliberalismo leva a cabo a sua guerra mundial, em todo o mundo grupos daqueles que não se conformam ganham forma, núcleos rebeldes.” Aqueles que são considerados dispensáveis pelo sistema capitalista globalizado estão a lutar. “Mulheres, crianças, idosos, indígenas, ecologistas, homossexuais, lésbicas, seropositivos, trabalhadores e todos os homens e mulheres que não são apenas os ‘restantes’, mas que ‘incomodam’ a ordem estabelecida e o progresso mundial rebelam, organizam-se e lutam.” Nesses bolsos vive a esperança pela humanidade, por um mundo melhor, onde caibam muitos mundos.
Os bolsos de resistência na Europa aguardam com entusiasmo o encontro com as Zapatistas que cruzaram e vão cruzar o Atlântico para estar aqui connosco. Nas palavras de SubGaleano: “Vamos para agradecer ao outro a sua existência. Para agradecer as lições que a sua rebeldia e a sua resistência nos ofereceram. Para entregar a flor prometida. Para abraçar o outro e dizer-lhe ao ouvido que não está só. Para sussurrar-lhe que valem a pena a resistência, a luta, a dor pelos que já não estão, a raiva contra o criminoso impune, o sonho por um mundo imperfeito, mas melhor: um mundo sem medo.”
Chega a meados de Julho uma comitiva de aproximadamente 150 Zapatistas a Paris e lá estarão representantes dos vários territórios que estenderam convites para dar as boas-vindas e acolher este movimento filosófico, político e poético no continente das Terras Insubmissas. Em Portugal contamos com quase um mês de atividades espalhadas pelo país, em datas ainda por acordar com as companheiras Zapatistas.
Obrigada EZLN pelas ações, a visão, as palavras, o apoio, a sabedoria, a solidariedade, a luta, a coragem, a alegria.
Começou a invasão.
Declaração pela Vida
Sexta parte: Uma montanha em alto-mar
http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2020/10/06/sexta-parte-uma-montanha-em-alto-mar/
Ação em Vigo na qual participaram 2 DiEMers:
https://videos.coletivos.org/videos/watch/ce1044ec-741a-475f-88d0-b86940c481cc
Ana Sophie Salazar pertence ao coletivo de Setúbal do DiEM25.
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