Junho é o mês do orgulho LGBTQIA+, em memória dos protestos de Stonewall, em 1969, quando gays e travestis entraram em confronto com a polícia por várias noites seguidas, em Greenwich Village, nos Estados Unidos da América. Na época, o sistema jurídico americano era abertamente anti-homossexual, enquanto a polícia sistematicamente fazia “rusgas” em bares gays, muitas vezes violentas. Stonewall era um bar que na noite de 28 de junho de 1969 presenciou uma revolta por parte da comunidade gay que frequentava aquela área.
No ano seguinte da revolta, houve manifestações em Nova York, Los Angeles, São Francisco e Chicago. Manifestantes caminharam por 51 quarteirões em Nova York naquela que pode ser considerada a primeira parada do orgulho gay. No ano seguinte, a marcha para relembrar Stonewall chegaria à Europa, Londres e Paris, na parte ocidental de Berlim e Estocolmo. Essas marchas destacam um novo momento no movimento LGBTQIA+, em que estas pessoas começam a ocupar o espaço público, a assumirem suas identidades sexuais e de género. Assiste-se a um desenvolvimento crescente e contundente deste movimento, com o aparecimento de diversas organizações pró-direitos LGBTQIA+ e mudanças concretas em diversos sistemas jurídicos ao redor do mundo.
Mas nem todas as letras da sigla do movimento contam com o mesmo progresso e muitas delas têm suas necessidades e lutas específicas ou autónomas. Quem imagina que os problemas e especificidades de cada grupo do movimento LGBTQIA+ são os mesmos, ainda não atentou em cada sigla. Lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais, queer, intersexo, assexuais e muitos outros grupos, têm agendas sociais e políticas diferentes.
A importância de um movimento que une as reivindicações comuns de todos estes grupos é fundamental, assim como é vital para cada grupo manter paralelamente as suas próprias agendas. É como unir forças no todo, sem se esquecer de cada parte.
Queremos, assim, destacar a importância do movimento feminista lésbico que denuncia a dupla opressão sofrida por mulheres (aqui entendidas como pessoas que se identificam com o género feminino) que desafiam a heteronormatividade ao relacionarem-se afetiva e sexualmente com outras mulheres. Essa dupla opressão revela dois problemas: a misoginia presente no sistema patriarcal e a homofobia.
Sobre a primeira opressão, temos pouco a dizer na semana em que o relatório das Nações Unidas (PNUD), mais uma vez, demonstrou o preconceito contra mulheres em patamares inaceitáveis como “90% da população mundial tem algum preconceito contra mulheres” ou 25% dos entrevistados acreditam que é justificado agredir a parceira.
Sobre a segunda opressão, muito além de olhar somente para a homofobia, é preciso olhar para uma soma (ou multiplicação resultante) de misoginia com homofobia, porque os preconceitos aqui funcionam em conjunto.
“As lésbicas não são mulheres”, afirmou Monique Wittig num artigo de 1980, causando uma onda de protestos e interrogações no movimento feminista. Wittig defendia que as lésbicas, por não fazerem parte da relação heterossexual, colocam em causa a heteronormatividade na qual assenta o sistema patriarcal e a construção de papeis de género. O conceito ‘mulher’, assim, só se aplicaria, para esta autora, no âmbito de uma relação heteronormativa, na qual os papeis de género estão distribuídos e na qual existe uma hierarquia de poder. Escapando dessa heteronormatividade, as lésbicas escapam também ao conceito de género a que estariam votadas a nascença. Por isso, para a autora, as lésbicas não poderiam ser consideradas mulheres.
Pois, se não são “mulheres”, não são aquilo que a sociedade espera das “mulheres”, afinal as lésbicas não procriam (em tese), não servem para o casamento heterossexual, não são boas mães, “afinal não servem para nada, são um desperdício social”, faz parte do senso comum. Assim, fica mais fácil perceber como os preconceitos se interrelacionam e se multiplicam: mulher + lésbica.
O feminismo lésbico insere-se no movimento feminista global pela igualdade entre todas as pessoas feminizadas, que atualmente reconhece a interseccionalidade das diferentes camadas de opressão a que estão sujeitos os corpos que não se enquadram no sistema hétero-patriarcal.
No entanto, o feminismo lésbico REALÇA também as questões específicas enfrentadas por mulheres lésbicas, bissexuais, trans e queer dentro do contexto do feminismo e do ativismo LGBTQIA+.
Quando a misoginia e a homofobia se interseccionam, o movimento LGBTQIA+ não basta, porque não tem em conta esta especificidade, daí a importância do MOVIMENTO FEMINISTA LÉSBICO no combate a estas formas de opressão em conjunto. Isto significa lutar contra a violência de género direcionada a mulheres lésbicas, combater o assédio no local de trabalho e reivindicar igualdade de direitos e proteções legais para todas as mulheres, independentemente da sua orientação afetiva e sexual. O movimento também se preocupa com a saúde e bem-estar das mulheres lésbicas, bissexuais, trans e queer, nomeadamente no acesso a cuidados de saúde adequados, incluindo cuidados específicos para questões de saúde sexual e reprodutiva.
A principal bandeira do feminismo lésbico é a luta pela visibilidade e pelo reconhecimento das vivências das mulheres lésbicas, cujas vozes e necessidades têm sido negligenciadas e subalternizadas tanto no movimento feminista como na luta contra a homofobia nos movimentos LGBTQIA+. O feminismo lésbico procura amplificar essas vozes e destacar as questões específicas que vivem as mulheres que amam outras mulheres.
Este movimento desafia a heteronormatividade, desafiando as normas de género e os papeis atribuídos às mulheres. Rompe com os estereótipos de feminilidade e masculinidade e defende a liberdade de expressão de género, rejeitando a ideia de que a sexualidade de uma mulher deve ser determinada pelo desejo masculino. O movimento promove a aceitação e celebração da diversidade de identidades de género e sexualidades, procurando criar um mundo mais inclusivo e igualitário para todas as pessoas.
Manamiga – escola feminista
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