A Europa Fortaleza falha para com a humanidade

Sona Prakash
Há décadas que pessoas perdem as suas vidas a tentar entrar na Europa. Em Junho de 2018 o número de migrantes mortos era de 34.361, e continua a aumentar.
As mortes ocorrem no mar, nos centros de detenção, nas unidades de asilo e até mesmo nos centros das cidades. Recentemente, a UE pôs termo às patrulhas marítimas no Mediterrâneo, que salvaram cerca de 45.000 refugiados no passado. A Itália declarou as suas águas fechadas a barcos salva-vidas e pediu para que outros países abrissem os seus próprios portos, mas nenhum se chegou à frente.
Isto não é uma “crise de refugiados”, mas sim uma crise de valores e ineptidão europeia. Em vez de formular uma solução baseada na solidariedade e responsabilidade partilhada, a Europa está a empurrar o assunto da migração para além fronteiras pagando à Líbia, por exemplo, para interceptar, deter e torturar migrantes.
As pessoas têm pouca escolha para além de fugir à guerra, à perseguição ou à pobreza miserável. E não nos esqueçamos do papel da Europa na criação destas circunstâncias dolorosas: a destruição e guerra no Afeganistão, na Síria, no Iraque, etc., e os acordos económicos e de comércio que exacerbam a pobreza na África. Atirar dinheiro (ajuda humanitária) a estes países, como a UE faz, não terá nenhum efeito a longo prazo enquanto estas políticas se prolongam.
Ao invés, a Europa deverá renovar completamente o que é conhecido como o Sistema de Dublin, o qual força os imigrantes a ficarem no primeiro país da UE onde foram registados.
Sistema de Dublin 
Devido à sua localização geográfica, a Grécia e a Itália recebem a maioria dos refugiados. São registados e são recolhidas as suas impressões digitais à chegada. Mas as instalações estão sobrelotadas, as listas de espera são longas e os benefícios estatais muito limitados. Muitos vivem nas ruas e são alvos de abusos sexuais, prostituição forçada e escravatura doméstica na Itália. São compelidos a procurar asilo noutro local.
Mas países, como a Holanda, param o processo de quem procura asilo, quando as suas impressões digitais são identificadas, invocando o Sistema de Dublin para os deportar de volta ao país em que foram registados. Alguns refugiados queimam as suas impressões digitais para evitarem ficarem presos neste “Artigo 22” (Catch 22). Aqueles já apanhados nesta situação (“Dubliners”) não esperam, obviamente, para ser deportados, mas “desaparecem”. Em 2018 os Países Baixos fizeram 1150 pedidos de Dublin à Itália, mas apenas 180 pessoas foram efectivamente devolvidas. Os pedidos de Dublin caducam ao final de 18 meses – e os “Dubliners” esperam ficam fora do radar durante esse tempo.
Os centros de asilo holandeses não aceitam “Dubliners”, apesar de alguns terem abrigo em residências individuais. Os seus anfitriões abstém-se de os registar junto das autoridades, devido à alta probabilidade de deportação. Isto deveria servir para nos relembrar de outra época, há décadas atrás, em que muitos habitantes de Amesterdão desafiaram as autoridades para esconderem vítimas de perseguição nas suas casas.
O Regulamento de Dublin coloca um esforço desproporcional em países costeiros, tais como a Grécia e a Itália. Em 2015, a UE tentou aliviar este fardo, realocando 160.000 refugiados para outros países da UE, seguindo quotas baseadas na capacidade dos países. Contudo, apenas 30% foram efectivamente reinstalados. Os Países Baixos prometeram acolher 8712 refugiados de Campos gregos em 2017 – mas desde Abril de 2019 apenas 1755 foram recebidos. Milhares de requerentes de asilo permanecem presos em sítios como a Grécia, à espera de serem reunidos com membros familiares na Alemanha e noutros locais. A maioria dos países recebeu abaixo da sua quota; outros recusaram completamente, nomeadamente o grupo de Visegrado: República Checa, Hungria, Polónia e Eslováquia. Apesar da maioria no Parlamento Europeu ser a favor de substituir o regulamento de Dublin, por um sistema centralizado de responsabilidade partilhada, a intransigência destes governos ainda o impede.
Deportações que implicam risco de vida
Não existe uma política comum da UE contra deportação que implique risco de vida. Os Países Baixos e a Suécia rejeitam a maioria dos requerentes de asilo vindos do Afeganistão, enquanto a França e a Itália aceitam quase todos, e não utilizam o regulamento de Dublin para os mandar embora. Mas apenas 35% dos requerentes de asilo afegãos foram aceites nos Países Baixos. Os restantes devem, por princípio, regressar ao Afeganistão, um dos países mais perigosos do mundo – e agora pior do que nunca. Estima-se que em 2018 26.500 pessoas tenham sido lá mortas, incluindo 3.804 civis e mais de 900 crianças. Desde 2015, 160 requerentes de asilo afegãos foram forçados a entrar em aviões de volta a Kabul nos Países Baixos. Dezenas estão neste momento em risco de serem deportados. Centenas desapareceram ou fugiram para outro país da UE.
Ao falhar aos refugiados, a Europa falha a si mesma
“Abandonámos, praticamente, a solidariedade mútua entre os estados membros, um princípio central sob o qual a União foi construída. Os refugiados e as suas vidas tornaram-se no objecto de um jogo político de culpabilização, combustível para o populismo de extrema-direita e xenofobia”, disse Cornelia Ernst, MPE.
Já é hora de nos perguntarmos se uma cultura poderá ser chamada de civilizada quando trata as pessoas como alvos para abuso porque vêm de países pobres devastados pela guerra.
Apelamos à UE para introduzir um procedimento centralizado de asilo, sem mais demoras, um que possa ser iniciado em qualquer ponto de chegada na UE. Os critérios de alocação de países hospedeiros deveriam incluir as preferências do requerente de asilo, assim como a capacidade do país. Países membros não podem continuar a beneficiar de recursos agrupados da UE sem partilharem a responsabilidade em tempos de necessidade. Aqueles que excedem as suas obrigações de refugiados merecem financiamento prioritário, enquanto os que ficam aquém deveriam ser penalizados.
Deixem-os entrar!
No DiEM25 dizemos: deixem-os entrar. É um direito humano fundamental deles – pelo qual nós também beneficiamos: A Europa está a envelhecer. Precisamos de imigrantes. Precisamos de refugiados.
Reivindicamos um sistema de asilo humano comum, pelo encerramento de centros de detenção e por uma provisão adequada de instalações de recepção e apoio na procura de emprego. Propomos uma operação de busca e salvamento europeu para prevenir a morte de imigrantes no mar. A externalização das fronteiras da UE para a Líbia e outros países deve ser terminada.

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