No sábado passado, na cidade italiana de Macerata, um jovem afiliado à extrema-direita, disparou contra Gideon Azeke, Jennifer Otiotio, Mahmadou Touré, Wilson Kofi, Festus Omagbon e Omar Fadera. Eles foram escolhidos por causa da cor da pele e das suas origens africanas.
Dias antes do ataque, foram encontradas várias malas em Macerata com os restos mutilados de Pamela Mastropietro, uma jovem mulher toxicodependente. Os principais suspeitos deste assassinato horrendo são dois vendedores de drogas nigerianos. O homem armado que levou a cabo os ataques de sábado afirmou, na sua confissão, que tinha saído à rua com o intuito de caçar negros, para vingar a morte da jovem rapariga, e com a intenção de matar todos os imigrantes vendedores de drogas. Os media apressaram-se a mostrar os ataques como atos de um indivíduo mentalmente instável, ou como crimes passionais, mas o contexto em que os ataques ocorreram não corrobora nenhuma destas justificações.
Pelo contrário, em vez de vingar o assassinato da jovem mulher, o homem que disparou sobre os imigrantes quis enviar uma mensagem clara aos seus compatriotas: a imigração é uma ameaça para todos nós, particularmente para os membros mais vulneráveis da sociedade.
Infelizmente, esta mensagem tem uma audiência ávida. Os líderes da extrema-direita italiana, Matteo Salvini e Georgia Meloni, aproveitaram todas as oportunidades para insistir no facto de que, apesar dos ataques serem claramente criminosos, a responsabilidade última dos mesmos pertence “àqueles que encheram a Itália de imigrantes”.
A nossa resposta dever ser a de chamar as coisas pelo seu nome: o que aconteceu em Macerata foi um ato de terrorismo fascista, o ataque deste tipo mais grave que ocorreu em Itália desde os “Anos de Chumbo”. As intenções deste ato não foram apenas espalhar o terror entre as pessoas de cor que vivem em Itália, mas também jogar com o medo difuso que assombra a opinião política italiana, no que diz respeito à imigração. Mais, para além das questões de opinião política ou de filiação partidária, o aparato teatral com que o atacante se entregou à polícia, exibe precisamente todos os elementos que constituem a essência implícita de uma ideologia fascista: ou seja, o fascismo como culto obsceno da morte. Porque é que então os líderes políticos italianos parecem não querer reconhecer estes factos?
A falha do centro-esquerda em reconhecer a natureza racista e fascista dos ataques é, nada menos, do que o culminar de uma série de oportunidades onde não se assumiu responsabilidades. Estas atitudes, quais profecias que se cumprem a si mesmas, têm sido o desfecho lógico do pressuposto segundo o qual, a opinião pública italiana foi tomada por um senso comum “xenófoba”, ou “anti-anti-fascista”. Consequentemente, as forças progressivas em Itália têm tolerado a emergência daquilo que Hannah Arendt chamou “o pensamento racial”, que se encontra agora num processo de solidificação numa “ideologia racista” genuína.
Os Mitos da Imigração
O mito da “imigração como problema social” tornou-se num facto estabelecido, abrangendo todo o espectro político, tendo como consequência que, a linha que divide as diferentes opções políticas deslocou-se das questões relativas ao problema da imigração, em si mesmo, para as suas possíveis soluções. Consequentemente, os vários autores políticos, ainda que não se encontrem necessariamente comprometidos como um “pensamento racial”, acabaram por aderir ao discurso único segundo o qual, as políticas de imigração são o problema fundamental.
Não importa a quantidade de esforço que é posto na evidência estatística, que prova a falsidade da ideia segundo a qual, os “Europeus nativos” estão a ser invadidos e substituídos por imigrantes Africanos. Como nos lembra Hannah Arendt, uma ideologia não é uma doutrina teórica, mas um instrumento de persuasão de massas, que apela às “necessidades políticas imediatas”, de mulheres e homens, ou por outras palavras, às suas experiências de vida e desejos.
Não há razão para apelar a uma verdadeira reflexão e silêncio, como fez o Presidente da Câmara de Macerata, quando, temendo mais divisões e violência, pediu a desconvocação da manifestação anti-racista e antifascista, organizada para o dia 10 de fevereiro, na sua cidade. Em vez de apaziguar tensões, o silêncio que o Presidente da Câmara pede corre o risco de deixar aberto o espaço a quem semeia o ódio, porque, de momento, são estas as vozes que dominam o primeiro plano do debate público.
O Silêncio não é Solução
É por esta razão que a luta contra todo o tipo de barbárie, como a que vimos em Macerarta, exige, não o silêncio, mas símbolos poderosos. Temos de opor aos atos pseudo-heróicos do assaltante neofascista, milhares de atos diários de resistência. Temos de lutar contra o culto fascista da morte, com a frase usada pelas comunidades Zapatistas de Chiapas, que dão as boas vindas aos visitantes que vêm como amigos:” Viva a vida, abaixo a morte!”. Com isto bem presente, nós do DiEM25 de Paris e do DiEM25 de França, congratulamo-nos com o sucesso da manifestação de sábado passado que, apesar da oposição, juntou milhares de cidadãos comprometidos, em Macerata, espalhando demonstrações de solidariedade para todo o mundo. Convidamos todos os que querem parar a corrida à barbárie, no nosso continente, para aproveitarem todas as ocasiões para falarem contra o racismo e o fascismo, num espírito de solidariedade e de desobediência construtiva.
Viva a Vida e Abaixo a Morte!
Nicola Bertoldi, encontra-se atualmente a realizar um doutoramento em História e Filosofia da Ciência, na Universidade de Paris 1 e é um membro ativo do DiEM25.
Foto: Danilo Balducci/Press Assocation.
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