Nos meandros da (in)justiça portuguesa, será que como meros cidadãos, anónimos, conseguimos ser ouvidos sem precisar do apoio de um gabinete jurídico milionário? Será que podemos influenciar de forma positiva e significativa a acção das instituições e os procedimentos do estado?
Neste momento, está a ser-nos vedada a possibilidade do julgamento de actos gravíssimos de corrupção cometidos pelo mais alto representante do poder executivo do estado, por motivo de erros processuais da própria atividade da justiça no procedimento judicial em curso. Para além disso existe um problema grave na morosidade da justiça neste processo, o que é uma regra generalizada para todos os processos que envolvem altos dirigentes políticos e outros cargos de grande poder e interesse público (como o sector financeiro).
Não temos o tempo da injustiça! Queremos justiça célere para estes casos, fazendo com que o sistema seja capaz de reparar os erros abismais que comete, pois a democracia assim o exige.
Os cidadãos portugueses têm assistido atónitos ao desenvolvimento de um processo judicial conhecido como “Operação Marquês”. Entre os vários arguidos deste processo, destaca-se José Sócrates, ex-primeiro-ministro da República Portuguesa, indiciado por diversos crimes que terá praticado enquanto tal. Após o Ministério Público deduzir em Outubro de 2017 a acusação por prática de crimes que terão ocorrido entre 2006 a 2015, o processo seguiu para o processo preliminar de “Instrução” cuja decisão foi conhecida em Maio deste ano. Neste processo foi descartada, entre outras, a acusação de corrupção, justificada por diversos erros processuais durante a fase de inquérito (prescrição de prazos enquanto decorria a instrução; recolha de provas realizada de forma ilegal – existiam provas válidas e relevantes provenientes de outro processo judicial que terão transitado entre processos com falhas procedimentais; entre outros), mas foi mantida a acusação de branqueamento de capital e falsificação de documentos, diretamente relacionados com a acusação por corrupção, já que o capital em causa teve origem em actividades ligadas a decisões tomadas pelos dois governos chefiados por José Sócrates.
Este é um exemplo público e claro, da forma como o Estado português não zela pelos nossos direitos mais fundamentais. Começando pela justiça.
Este caso diz também respeito aos nossos direitos enquanto cidadãos europeus. De acordo com com os artigos 41.º e 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, 2007/C 303/01, JOUE, 14/12/2007 (3), o Estado e o Ministério Público português, que representam os cidadãos portugueses no processo em causa, devem garantir uma série de direitos, entre os quais se destacam:
“Direito a uma boa administração: Todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições, órgãos e organismos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável.“
“Direito à acção e a um tribunal imparcial: Toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma acção perante um tribunal nos termos previstos no presente artigo. Toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei. Toda a pessoa tem a possibilidade de se fazer aconselhar, defender e apresentar em juízo.”
Uma vez que o processo relacionado com a “Operação Marquês” teve início em 2014 e se encontra ainda em fase de instrução, e tendo o ministério público informado de que vai recorrer contra a decisão instrutória, torna-se flagrante e evidente a falta de acção das instituições num prazo razoável.
Por outro lado, tendo sido descartada a possibilidade de acusação por corrupção, apenas e só por supostos erros processuais na construção da acusação, estando ainda em causa benefícios e ganhos ilegítimos consideráveis, é flagrante a falha do sistema judicial (em que somos representados pelo ministério público), impossibilitando-nos o direito ao julgamento desse crime, enquanto cidadãos lesados.
Desta forma, embora o processo judicial ainda esteja a decorrer, é importante que este assunto ganhe relevância a nível europeu, porque existem direitos fundamentais de todos os cidadãos europeus a serem postos em causa, e os mecanismos judiciais portugueses não estão, comprovadamente, a gerir a situação de forma a garanti-los.
Estas falhas constantes em procedimentos judiciais de alta corrupção, são particularmente nefastas no seu efeito social, pois minam simultaneamente a confiança nos três pilares fundamentais das funções do estado:
judicial – os tribunais não estão a conseguir gerir este processo adequadamente e em tempo útil;
legislativo – o edifício legal é demasiado complexo e alimenta, por vezes intencionalmente, a inoperância judicial e executiva;
executivo – estão em causa crimes de corrupção praticados por um primeiro-ministro, no desempenho das suas funções.
Este é um exemplo entre muitos (demasiados) casos de corrupção óbvia de elevados dirigentes políticos ou de instituições de interesse público (onde se destaca ainda sector financeiro), em que mesmo perante a evidência das provas não há uma conclusão satisfatória do processo para os cidadãos, ocorrendo não só em Portugal, mas por toda a Europa e por todo o mundo.
Estes exemplos de má conduta são cometidos à vista de todos e têm consequências directas e óbvias para a nossa vida, sendo que o custo anual da corrupção para o estado português é de cerca de 18,2 mil milhões de euros, um pouco mais do que o valor total orçamentado para o Serviço Nacional de Saúde. Destaque-se bem, a corrupção em Portugal custa-nos anualmente mais do que todo o SNS!
Não é assim de surpreender, com todos os pilares do estado de direito postos em causa, que a indignação, o ódio ao Estado, ao trabalhador público, o discurso anti-sistema reducionista, contaminem actualmente a sociedade de uma forma alarmante.
No século XXI, no seio da Europa, não podemos ignorar o que se está a passar neste momento em Portugal.
Queremos uma verdadeira Democracia! E para isso exigimos verdadeira Justiça!
Para apresentares a tua queixa sobre este caso à União Europeia:
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